
CBD e o Transtorno do Espectro Autista (TEA)
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento que varia muito em gravidade e é caracterizado por déficits na comunicação e interação social, interesse restrito e comportamentos repetitivos, além de outras características. Durante as últimas três décadas, houve um aumento de três vezes no número de crianças diagnosticadas com TEA. Condições médicas concomitantes, como epilepsia, deficiência intelectual e problemas de comportamento, podem ocorrer nesses indivíduos.
Vários fatores genéticos, perinatais e ambientais parecem estar envolvidos nas causas deste transtorno. Alguns pesquisadores têm evidenciado um desequilíbrio no sistema de neurotransmissão endógeno, como o serotoninérgico, o ácido γ aminobutírico (GABA) e o sistema endocanabinoide , que regulam funções como respostas emocionais e interações sociais tipicamente prejudicadas no TEA.
Há um interesse crescente no uso de Cannabis e seu principal componente não psicoativo nem intoxicante, o canabidiol (CBD), como tratamento para distúrbios de saúde mental e neurodesenvolvimento, como, por exemplo, o Transtorno do Espectro Autista. Evidências pré-clínicas sugerem que uma das ações do CBD é que ele modula os níveis de substâncias como o glutamato e ácido γ-aminobutírico inibitório (GABA), inclusive em regiões do cérebro ligadas ao TEA, como os gânglios da base e o córtex pré-frontal dorsomedial.
Uma pesquisa realizada em 2019 por pesquisadores do Departamento de Ciências Forenses e do Neurodesenvolvimento, Instituto de Psiquiatria, Psicologia e Neurociência, do King's College London, em Londres, no Reino Unido, utilizaram ressonância magnética para medir os níveis das substâncias glutamato e GABA no cérebro de pacientes com e sem diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista. Para isso, participaram do estudo 34 pacientes masculinos, sendo 17 neurotípicos (sem diagnóstico de TEA) e 17 com diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista. Foram administradas doses únicas de 600mg de CBD ou placebo com, ao menos, 13 dias de intervalo. Com isso, observou-se que o CBD modula estes sistemas glutamato-GABA e que há uma resposta diferenciada no cérebro autista.
Uma revisão sistemática, realizada por pesquisadores da Unidade de Psiquiatria do Departamento de Medicina Clínica e Experimental, da Universidade de Catania, na Itália, e publicada em 2020, resumiu a literatura sobre o uso de canabinoides no Transtorno do Espectro Autista. Os resultados foram promissores, pois os canabinoides pareceram melhorar alguns sintomas associados ao TEA, como comportamentos problemáticos, problemas de sono e hiperatividade, com efeitos colaterais cardíacos e metabólicos limitados. Ainda, os canabinoides geralmente permitiram reduzir o número de medicamentos prescritos e diminuiram a frequência de convulsões em pacientes com epilepsia comórbida. Os mecanismos de ação podem estar ligados ao desequilíbrio excitatório/inibitório encontrado em pessoas com TEA. No entanto, novos ensaios com melhor caracterização e homogeneização das amostras e resultados bem definidos devem ser implementados. Uma descoberta importante deste estudo de revisão foi que a quantidade e a dosagem de medicamentos não canabinoides utilizados nos pacientes com TEA foram reduzidos.Os resultados promissores nas pesquisas, o perfil de segurança adequado do tratamento e relatos de pacientes e familiares que contam sobre a melhora ou até desaparecimento de alguns sintomas assim como a redução ou interrupção na medicação convencional, fazem dos canabinoides uma excelente opção para o tratamento do Transtorno do Espectro Autista.
Referências:
Bilge, S., & Ekici, B. (2021). CBD-enriched cannabis for autism spectrum disorder: an experience of a single center in Turkey and reviews of the literature. Journal of cannabis research, 3(1), 1-11. DOI: 10.1186/s42238-021-00108-7
Fusar-Poli, L., Cavone, V., Tinacci, S., Concas, I., Petralia, A., Signorelli, M. S., ... & Aguglia, E. (2020). Cannabinoids for people with ASD: a systematic review of published and ongoing studies. Brain sciences, 10(9), 572. DOI: 10.3390/brainsci10090572
Pretzsch, C. M., Freyberg, J., Voinescu, B., Lythgoe, D., Horder, J., Mendez, M. A., ... & McAlonan, G. M. (2019). Effects of cannabidiol on brain excitation and inhibition systems; a randomised placebo-controlled single dose trial during magnetic resonance spectroscopy in adults with and without autism spectrum disorder. Neuropsychopharmacology, 44(8), 1398-1405. DOI: 10.1038/s41386-019-0333-8